A garantia dos bens de consumo constitui um direito fundamental dos consumidores, assegurando que os produtos adquiridos estejam em conformidade com o contrato que foi firmado e sejam adequados ao uso a que se destinam.
No ordenamento jurídico português, a lei de defesa do consumidor, Lei n.º 24/96 de 31 de julho e o DL n.º 84/2021, de 18 de outubro, estabelecem o regime jurídico aplicável à garantia dos bens de consumo, protegendo os consumidores contra defeitos e desconformidades.
De acordo com o DL 84/2021, os bens móveis adquiridos por consumidores beneficiam de uma garantia legal de três anos a contar da entrega do bem. Durante este período, o consumidor tem direito à reparação, substituição, redução adequada do preço ou resolução do contrato, caso o bem apresente desconformidades. Contudo, no que diz respeito aos bens usados, as partes ao abrigo da liberdade contratual, podem convencionar um prazo de garantia reduzido, nunca inferior a 18 meses. No entanto, a exclusão total da garantia é proibida e contrária à lei.
E se o vendedor exigir que o comprador assine uma declaração de renúncia à garantia? Será esta cláusula válida perante a lei?
A renúncia à garantia por parte do consumidor é uma prática abusiva e nula, sendo que, à luz do artigo 16.º da Lei n.º 24/94 estabelece que é nula qualquer cláusula contratual que exclua ou limite os direitos conferidos ao consumidor por este diploma. Assim, qualquer tentativa de renúncia prévia à garantia é considerada ilegal e sem efeito, mesmo que tenha sido acordada entre as partes.
A nulidade dessa renúncia justifica-se pelo princípio da proteção do consumidor, que é considerado a parte mais vulnerável na relação de consumo. E, portanto, se um vendedor tentar impor uma cláusula que exclua a garantia ou limite os direitos do consumidor, esta será automaticamente considerada nula e sem efeito. O consumidor continuará a ter direito à garantia legal e poderá exigir a sua aplicação junto do vendedor. A jurisprudência dos tribunais portugueses tem-se pronunciado sobre esta questão, nomeadamente o tribunal da Relação de Lisboa, que, no acórdão proferido em 05/11/2020, refere: “É nula a cláusula de renúncia à garantia, subscrita pelo consumidor num contrato de compra e venda de um bem de consumo”.
Por exemplo: a Maria comprou no stand do Manuel um veículo automóvel por 5.000,00 €, tendo assinado um documento apresentado pelo vendedor em que teria de renunciar à garantia do mesmo. Sucede que, passado duas semanas da compra e venda e da utilização do referido veículo, o mesmo deixou de poder circular, devido a uma avaria grave que apresentava. Sucede que, mesmo tendo a Maria assinado o referido documento, este será nulo, uma vez que a renúncia à garantia implica a exclusão ou limitação dos direitos conferidos pela lei do consumidor, o que não é permitido perante a lei. Nestes termos, a Maria mantém os direitos que lhe são conferidos pela lei do consumidor, podendo exigir a reparação ou substituição do veículo, a redução do preço ou a resolução do contrato.
Concluindo, a garantia dos bens de consumo é um direito irrenunciável dos consumidores, e qualquer tentativa de renúncia ou limitação desse direito é nula, não produzindo, por isso, qualquer efeito.